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Leonardo Sakamoto

Você trocaria sua filha por um carro usado?

Leonardo Sakamoto

18/11/2010 22h48

A Organização Internacional do Trabalho estima em 12,3 milhões o número de escravos em todo o mundo, incluindo aqueles e aquelas usados para exploração econômica e para exploração sexual. Esse crime não é monopólio de determinado povo, mas está presente em todo o lugar, dos países ricos aos pobres, da América do Sul à Europa. Se por aqui temos escravos em fazendas de gado, cana ou carvoarias, há pessoas obrigadas a trabalhar na periferia de Paris, em plantações nos Estados Unidos ou em prostíbulos no Japão.

A história abaixo choca, mas não é muito diferente daquelas em que crianças e jovens são vendidas no interior do Brasil para quitar dívidas ou "fazer dinheiro" ou trocadas por comida e/ou bens de consumo e depois são obrigadas a se prostituírem em bordéis em cidades, garimpos ou beiras de estradas (segundo a Polícia Rodoviária Federal são 1820 pontos de exploração sexual de crianças e jovens nas estradas federais)para a alegria de turistas, caminhoneiros, empresários – enfim, de todos nós, "gente de bem".

As informações abaixo são da BBC Brasil:

– Os pais de uma jovem estão sendo acusados em um tribunal na França de ter trocado sua filha por um carro usado. A jovem, hoje com 30 anos, foi transformada em escrava doméstica e sexual pelo casal que a adquiriu. O casal que escravizou a jovem também é réu no julgamento do caso, iniciado nesta semana na cidade francesa de Melun.

– De acordo com o jornal francês Le Post, a jovem, identificada apenas como Sabrina, tinha 23 anos quando foi entregue a Franck Franoux, hoje com 51 anos, e Florence Carrasco, 36, como parte do pagamento de um carro usado – ela foi estimada em 750 euros (R$ 1760,00). O cativeiro e tortura de Sabrina teriam ocorrido entre 2003 e 2006. Sabrina teria sido obrigada a viver acorrentada em um abrigo.

– Segundo a promotoria, durante o tempo em que ficou presa, ela: Foi queimada com ferro quente e cigarros; Espancada com barras de ferro e pedaços de madeira; obrigada a cuidar dos sete filhos do casal e manter relações sexuais com outros homens, que pagavam por isso.

– Em 2006, Sabrina ficou gravemente doente e foi deixada em frente a um hospital de Paris. Ela não tinha dentes e pesava apenas 34 quilos. Desde que foi abandonada no hospital, Sabrina passou por várias cirurgias, para a reconstrução de nariz e orelhas, que foram mutilados durante o tempo em que passou no cativeiro. Segundo a BBC, o advogado da vítima disse ao mesmo jornal que Sabrina teve "as duas orelhas queimadas, o cabelo raspado, o nariz quebrado. Ela foi queimada com cigarros (…). Ela foi estuprada em várias ocasiões." Em entrevista ao jornal Le Parisien, Sabrina afirma que ainda não consegue dormir. "Em algumas noites eu tenho lembranças. Eu não durmo", afirmou.

– Se forem considerados culpados, os acusados poderão ser condenados a penas que variam entre dois e 15 anos de prisão.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.